2ª etapa. Roncesvalle/Puente la Reina, 82.04 Kms
Depois de uma noite relativamente bem dormida, na verdade ainda foram alguns instantes a habituar-me à orquestra ronqueira, os peregrinos a pé foram os primeiros a levantar-se, ocasiãopara nos despedirmos de Marco.
Texto e fotografia: António José Soares
A manhã estava fresca, depois de preparadas as bicicletas, partimos, parando na localidade Burguete para o pequeno almoço. Aqui encontrei o nosso amigo francês a quem fiz referência no relato antecedente. O pequeno almoço foi bem reforçado, embora o dia estivesse fresco a etapa previa-se ser dura.
Fulvio perguntou se não me importaria que fossemos fazendo o caminho juntos, facto que não me perturbou muito, o italiano parecia ser boa companhia, e, nestas coisas, a entreajuda nunca é de desprezar.
Começámos por seguir as estradas paralelas ao caminho, onde se rolava melhor. Contudo, tem sempre a desvantagem de não ser tão místico, de enquadramento paisagístico inferior, e, por vezes, as distâncias até são maiores. Foi o caso da subida até ao Alto do Erro, cerca de 800 m de altitude.
Aqui chegados, influenciei Fulvio a enveredarmos pelo caminho. E, em boa hora, este troço era de uma beleza fantástica, um caminho estreito e rápido por entre vegetação, levou-nos a velocidades impensáveis, com algumas paragens obrigatórias para não atropelar os restantes peregrinos, a quem previamente avisávamos com caminhantes.
As palavras da ordem quando passávamos,eram sempre as mesmas buenos dias e buencamino.
De grande beleza natural
A beleza deste trajecto é extraordinária, dava regalo rolar assim. A satisfação interior é incrível, lembro-me de, só em criança sentir tamanho entusiasmo, aquando da ida em excursões de catequese.
A arquitectura coerente dos povoados por onde passávamos, era de assinalar, vastos monumentos com interesse histórico, sobretudo igrejas, a assinalar diferentes períodos da história, do românico ao barroco, passando pelo gótico e pelo renascimento, mas, sobretudo, devo destacar algumas igrejinhas românicas.
Finalmente próximo de Pamplona, retomámos a estrada, coincidia com o troço do caminho. Em Pamplona, quando procurávamos visitar a cidade, Fulvio arranjou forma de se colar a dois espanhóis com quem já nos tínhamos cruzados anteriormente. Feitas agora as apresentações, fiquei a saber os seus nomes: Camilo e Vítor, também tinham viajado no mesmo comboio até St-Jean. Saímos os quatro de Pamplona decidindo ir almoçar a Cizur Menor. Parámos num restaurante à saída desta vila. A parrilhada de peixe estava óptima. Coincidência, estavam também a almoçar quatro portugueses, do Norte, que ali trabalhavam na construção civil.
Depois da boa almoçarada seguimos os quatro, tínhamos pela frente o Alto delPerdón, na subida disse a Vítor e Camilo para irem andando, já que as nossas “cilindradas eram diferentes”. O trilho estava pejado de pedras, foi um verdadeiro tormento. Cheguei a vir atrás, duas a três vezes, ajudar o italiano a empurrar a bicicleta, dada a dificuldade do percurso.
A meio da subida encontrámos uma jovem checa de seu nome Gabriela. Aproveitámos para estar um pouco à conversa, enquanto descansávamos. Fulvio falava-lhe no seu filho que vivia em Praga, com uma compatriota da referida moça, eu, estava mais interessado em observá-la, tinha realmente uma figura deslumbrante.
Foi uma vitória a chegada ao Alto del Pérdon, o caminho, tão duro para ciclistas como para os peregrinos a pé, revelou-se uma verdadeira tortura.Finalmente no alto,o regozijo pelo feito alcançado, com as fotografias da praxe, junto das esculturas de ferro, ali colocadas em homenagem aos peregrinos.
Seguiu-se a observação da paisagem, com a longa e difícil subida, finalmente deixada para trás, antecedendo uma tresloucada descida até Puente la Reina, tal era a percentagem da sua inclinação, que nos atirou para velocidades incríveis. Ter enveredado de bicicleta pelo troço do caminho, teria sido muito arriscado. O pouco que faltava até Puente la Reina, pela descida do Perdón, foi efectuado a uma velocidade que chegou mesmo a atingir o máximo de 65,82 Kms Hora.
Final do dia
Neste segundo dia percorremos 82,04 Kms, chegando a Puentela Reina às 16:30 horas, a uma velocidade média de 14,87 Kms Hora. Tempo de pedal, 05:30:53.
Preferimos ficar num albergue que já ficava fora da pequena cidade, era moderno e amplo, com excelentes condições. Tinha piscina e um bom jardim, acabei por gastar só 17€ na dormida e jantar.
Por medo de contrair alguma lesão, estupidamente não experimentei a piscina, a temperatura da água estava um pouco fria, antagonizando com a excelente tarde de sol. Pensei que talvez não fosse aconselhável, com o receio de contrair alguma contractura muscular.
O local onde se situava o albergue é óptimo, aproveitei para lavar a roupinha, ou não fosse eu da terra das lavadeiras, as Torres Mondego.
Antes do jantar ainda fui até Puentela Reina para tirar umas fotos, encontrei os espanhóis Vítor e Camilo, que se tinham deixado ficar no primeiro albergue.
Procurei ser dos primeiros a deitar-me, porque adormecendo primeiro, não ouviria o habitual concerto de ronqueira, mas não escapei, alguém já tinha os seus motores diesel a trabalhar a alta velocidade.
Pela madrugada é que a festa foi rija. Alguém se lembrou de começar por dar um espectáculo “d’harpa e dança”. Consegui descortinar que o italiano tinha sido o primeiro, de forma tímida, seguiu-se-lhe um francês um pouco mais ousado, e, a seguir, um português bem mais descarado. Enfim, são coisas do caminho.
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