Durante o Outono tive a oportunidade de vivenciar duas situações distintas de promoção de, regiões no interior de Portugal, através da gastronomia e dos produtos endógenos. No Fundão, o “Míscaros – Festival de Cogumelos” e em Almodôvar com PROVERE valorização dos recursos silvestres do Alentejo.
Duas iniciativas diferentes mas com a mesma finalidade de dar a conhecer outras realidades culturais do país e fortalecer as economias locais.
A comida é tanto causa como vítima da mudança climática, mas também uma possível solução. As nossas escolhas alimentares têm um impacto direto no futuro do planeta.
Tendo isto em mente, os nossos anfitriões no Alentejo aproveitaram a ocasião para o lançamento e sensibilização para a campanha internacional “Food for Change” do Slow Food. Lançada com o objetivo de oferecer soluções para alguns dos problemas da atualidade, nomeadamente diminuir o impacto das alterações climáticas a partir de nossas ações quotidianas. Fortalecendo economias locais limpas, comércio justo e alimentos que fazem parte do nosso património. A comida deve ser um prazer e uma maneira de cuidar do nosso planeta.
Texto e fotografia: Vasco de Melo Gonçalves
No Fundão
A 10ª edição do “Míscaros – Festival do Cogumelo” realizou-se no Alcaide, município do Fundão, nos dias 16, 17 e 18 de Novembro, com gastronomia, exposições, workshops, passeios micológicos, live cookings e animação de rua.
Este evento foi organizado pela Liga dos Amigos do Alcaide, em conjunto com a Câmara Municipal do Fundão e a Junta de Freguesia do Alcaide, com o objetivo de promover o património fúngico do país, com mais de 300 espécies, no qual se destacam os míscaros, que nascem nas encostas da Serra da Gardunha.
Durante os três dias a povoação do Alcaide fica “irreconhecível”, as ruas estreitas enchem-se de tascas improvisadas com menus alusivos aos cogumelos e que fazem as delícias dos milhares de visitantes que acorrem à região. Durante dia e noite as ruas são calcorreadas por bandas de bombos e metais das mais diversas freguesias ou agrupamentos da região. É interessante verificar a adesão da juventude a este evento demonstrando, por um lado, o interesse pelas suas raízes e, por outro, o acreditar na região e no desenvolvimento da mesma.
A minha experiência
É impossível, neste espaço, descrever todas as boas sensações que tive na povoação do Alcaide por isso, decidi-me por apresentar dois momentos altos.
Na Tasca do Zé da Ermelinda degustei dois pratos diferentes, o primeiro um galo no forno com vinho acompanhado por vegetais salteados, batata e cogumelos. Um prato saboroso e com influências da vivência da família, em França, quando esteve emigrada. O segundo prato foi um arroz (malandrinho) de míscaro. Os dois pratos foram acompanhados por um vinho tinto caseiro e muito frutado. À sobremesa mais um produto da região, pudim de castanha com vinho do Porto.
Há muito que sou apreciador dos vinhos da Quinta dos Currais pela sua boa relação qualidade/preço. Marca de vinhos da região casa bem com a gastronomia local ligada aos cogumelos, às carnes e queijos. Foram dois excelentes vinhos que tive a oportunidade de experimentar. Um branco, de 2016, colheita selecionada com 13% que casa bem com os queijos da região. Castas: Fonte Cal, Arinto e Síria.
O segundo, um tinto reserva de 2012 com 14,5% que acompanha muito bem carnes e diferentes confeções de cogumelos. Castas: Touriga Nacional, Aragonês e Castelão. Estágio de 12 meses em barrica nova de carvalho francês.
Em Almodôvar
No Alentejo, através da Associação das Terras e das Gente da Dieta Mediterrânica Slow Food integrada no projeto Provere valorização dos recursos silvestres do Alentejo, fui conhecer outras realidades. A XII Feira do Cogumelo e do Medronho, em São Barnabé, tem como finalidade dar a conhecer o potencial da região através dos seus produtos mais valiosos, nomeadamente, os cogumelos, o medronho, o mel e o artesanato. Durante dois dias a pequena aldeia enche-se de visitantes que procuram descobrir a essência da região e das suas gentes. A minha estada de dois dias deu para conhecer, de certa forma, que as pessoas acreditam que só através de produtos de qualidade conseguem destacar-se e viabilizarem os seus negócios locais. Foi interessante ver o entusiasmo de Sónia Cabrita, uma produtora de medronho de São Barnabé, na projeção futura do seu negócio num universo muito masculino.
Cogumelos e medronho são também motivo para caminhadas de descoberta em contacto com a natureza e através de uma paisagem única.
A minha experiência
Também aqui as experiências gastronómicas foram, genericamente, de elevado padrão. Contudo destaco o almoço em Santa Clara-a-Nova confecionado pela Marília Guerreiro. Realmente as refeições valem pela qualidade dos produtos e pela forma como são confecionadas mas, o que as distinguem e nos fazem recordar é a sensação e emoções que sentimos na altura. Marília Guerreiro é uma cozinheira de mão cheia e que sabe transmitir o seu conhecimento de uma forma simples e genuína.
Do excelente repasto realço o queijo fresco com compota de figo da Índia, a açorda de perdiz com grão, as migas com mel e porco preto e, por fim, o pudim de abóbora. A refeição foi acompanhada por um vinho tinto Balanches, de 2017, da região de Mértola.
Durante a minha estada, em Amodôvar, fiquei alojado num turismo rural no Monte Abaixo. Nos pequenos-almoços e, à lareira e à conversa com os restantes elementos do grupo, tive a oportunidade de experimentar alguns excelentes produtos da região nomeadamente, o vinho tinto Herdade da Bombeira (2014), o azeite Amor é Cego e o pudim de Água Mel! De sonho…